O grande vinho que se relaciona com a tourada é o Jerez. Já tive a oportunidade de comentar sobre isto.
Haveria outros?
A justiça pode ser simbolizada pelo vinho, já ensinou S. Tomás.
Esta virtude cardeal está no meio termo, no equilíbrio entre a punição e a misericórdia. Tanto a crueldade excessiva quanto a “moleza” são injustas.
Os bons vinhos definem um equilíbrio entre o amargor, presente no fundo da língua, e a doçura, presente na ponta da língua. Formam uma “balança da Justiça”.
Só que como a degustação é dinâmica, há um sentido lógico nela, que começa pelo amargor e termina doce. Pois, a prática da virtude começa com dificuldade e termina com alegria.
Lembro que este “doce” nada tem a ver com sentimentalismo.
Este dinamismo fortalece a ideia da Justiça, tendo em vista a natureza do vinho e a da “sentença final”. Expliquemos.
Se um vinho começa não tão amargo e termina com doçura superior ao amargor inicial pode representar uma sentença absolutória.
Se um vinho começa amargo, agressivo e não termina com doçura proporcional, pode representar uma sentença condenatória.
A tourada também pode se relacionar com a Justiça. De um lado está o toureiro, a face racional, leve, o lado “doce”, o lado absolutório. De outro lado, o touro representando a face bruta, irracional, o lado “amargo”, o lado condenatório. A balança da Justiça está formada.
Assim, como o vinho, a tourada é dinâmica. O touro, inicialmente, começa violento e agressivo e o toureiro aos poucos vai “adoçando”, controlando o “amargor” do animal.
A “estocada final”, na realidade, é a vitória do lado doce, ponto final do caminho da virtude. Por isso, o toureiro recebe aplausos e homenagens, há comemoração e não tristeza e toda festa é alegre, leve.
A estocada final, na degustação, seria o momento em que o vinho é engolido, foi definitivamente “vencido”. É o momento da “sentença proferida”, após o decurso do processo judicial.
Se o touro é muito bom, ele pode ser “indultado”, foi “absolvido”. Qual vinho combinaria com isto? Poderia ser um tinto leve, um branco vigoroso como um Albariño das Rías Baixas, ou até mesmo um champagne ou uma cava.
Como não ver uma alegria esfuziante, como num champagne, neste “indulto”, com José Tomás (min 4:20):
Para representar uma tourada mais difícil com um animal bem feroz, um tinto encorpado de Rioja ou ainda um malbec argentino.
Marcelo Andrade, 9 de março de 2014